quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024


Mensagem do Arcebispo de Évora para a Quaresma 2024

Ao Povo Santo de Deus, peregrino em terras do Alentejo e Ribatejo, da Arquidiocese de Évora; seus Presbíteros, Diáconos e Consagrados ao Serviço de Todos, a Paz esteja convosco!

1. A Quaresma que nos prepara para a Páscoa deste ano de 2024, desperta-nos para a necessidade de valorizarmos o nosso encontro pessoal e comunitário com a Misericórdia de Deus. Será a partir desta experiência que renovaremos e fortaleceremos a Paz e a Alegria dos nossos corações e consequentemente, o testemunho humanizado das Comunidades Cristãs em que caminhamos na Fé.

É este o propósito do nosso Ano Pastoral, “Revelar juntos um novo rosto de Comunidade”; para que o Espírito Santo nos molde e amadureça neste propósito de conversão pessoal e comunitário, rezamos e discernimos com a Palavra do Evangelho: «Por isso reconhecerão que sois meus discípulos: Se vos amardes uns aos outros como Eu vos amei» (Jo 13, 35). Como sabemos, a lei do amor fraterno não é uma novidade das catequeses de Jesus, porém Cristo dá-lhe um novo sentido e uma nova medida, assumindo-se Ele próprio como esse sentido novo e essa nova medida: “(…) como Eu vos amei”. O Seu Amor tem uma única medida, amar sem medida, por isso entrega a Sua vida pela redenção de todos; o Seu Amor tem um único sentido, revelar-nos a Misericórdia do Pai, pois o seu alimento é fazer a vontade do Seu Pai (Cf. Jo 4, 34).

O Mandamento Novo sugere a Nova Aliança. Lei e Aliança consideram-se duas noções paralelas, assim Jesus, ao dizer, “(…) Dou-vos”, actua não como simples intermediário de Deus, à maneira de Moisés e dos Profetas, mas com autoridade própria e em nome próprio, como Filho de Deus e Salvador. É o Verbo de Deus que nos revela a Nova e Eterna Aliança. Deste modo, a nossa pertença a Jesus e com Ele ao Pai exige-nos a conversão e vivência desta Palavra: “Por isso reconhecerão que sois meus discípulos se vos amardes uns aos outros como Eu vos amei”.

2. Os Quarenta Dias a que chamamos Quaresma são um Tempo de Graça, “Kairós”, que se nós quisermos, nos proporcionarão momentos de reflexão e exame de consciência, para que experimentemos a beleza do abraço misericordioso de Deus e a riqueza que nos vem da experiência da vida fraterna, “Ó como é bom viverem os irmãos no Amor de Deus!” (Sal 133, 1).

O ruído em que vivemos com frequência pode-nos roubar a liberdade interior, sobrepondo-se ao nosso discernimento e tornando-nos insensíveis aos sinais dos tempos, «ao grito dos pobres e da terra». Deste modo, somos impedidos de escutar o nosso coração onde Deus fala e ecoam os gritos da solidão e da pobreza de muitos irmãos. Por isso, importa cultivar o jejum face a todos os excessos que nos solicitam exclusiva obsessão e provar o oásis do silêncio interior, onde se tornará possível compreender que a nossa sede corresponde à água-viva da Boa Nova do Senhor.

Eis uma oportunidade de excelente terapia que, se quisermos, repito, poderemos usufruir nesta Quaresma.

Oração, jejum e partilha fraterna são os três pilares da Quaresma; desde a mais remota tradição proporcionada pelos Padres do deserto, pelos Monges, Doutores da Igreja e Mendicantes, estas três práticas quaresmais renovarão as nossas vidas e farão das nossas Comunidades eclesiais, “Mães de coração aberto para todos os sedentos de Esperança”. Neste contexto da espiritualidade e da sabedoria cristã, recordo as palavras do nosso amado Papa Francisco, proferidas aos estudantes universitários na JMJ em Lisboa e agora citadas na sua Mensagem Quaresmal: «Procurai e arriscai; sim, procurai e arriscai. Neste momento histórico, os desafios são enormes, os gemidos dolorosos: estamos a viver uma terceira guerra mundial feita aos pedaços. Mas abracemos o risco de pensar que não estamos numa agonia, mas num parto; não no fim, mas no início dum grande espetáculo. E é preciso coragem para pensar assim» (03/VIII/2023). É um mundo novo que nasce, experimentando nós simultaneamente os gritos doridos do mundo velho que morre.

3. No contexto doloroso de violência generalizada e de “guerra mundial feita aos pedaços”, como refere o Santo Padre, proponho que a Renúncia Quaresmal deste ano, se destine às Igrejas do Médio-Oriente, vítimas de guerra e que façamos chegar a essas Comunidades a nossa partilha através da Santa Sé, ao serviço da Caridade do Papa Francisco.

Agradeço todo o esforço, dedicação e generosidade da Igreja Diocesana, nomeadamente da sua Cáritas, da sua Cúria e Economato, que permitiram o envio de 20.000€, correspondente à Renúncia Quaresmal de 2023, para as vítimas dos terramotos ocorridos na Turquia e na Síria. Também este quantitativo foi enviado através do ministério da Caridade do Santo Padre, o Papa Francisco.

Como já é tradição, confio mais uma vez a campanha da Renúncia Quaresmal 2024 à Cáritas Diocesana, aos Reverendíssimos Párocos, aos Serviços Centrais da Arquidiocese e à generosidade de todos os Cristãos, entidades, empresas e pessoas de boa vontade.

Com todos permaneço em comunhão de oração, jejum e caridade. E a todos desejo fecunda Quaresma e Santa Páscoa!

+ Francisco José Senra Coelho

Arcebispo de Évora

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

Palavra de Vida

Fevereiro 2024

Letizia Magri e equipa da Palavra de Vida

«Que, entre vós, tudo se faça com amor.» (1Cor 16,14) [1]

Este mês, como lâmpada para os nossos passos [Cf. Sal 119 [118], 105], deixemo-nos iluminar pela palavra e pela experiência do apóstolo Paulo.

Ele anuncia-nos, também a nós, como aos cristãos de Corinto, uma poderosa mensagem: o coração do Evangelho é a caridade, a ágape, o amor desinteressado entre irmãos. 

A nossa Palavra de Vida faz parte da conclusão desta Carta, em que a caridade é amplamente recordada e explicada em todas as suas caraterísticas: é paciente, benevolente, rejubila com a verdade, não procura o próprio interesse [Cf. cap. 13]

O amor recíproco, se for vivido na comunidade cristã, é bálsamo para as divisões que sempre a ameaçam e sinal de esperança para toda a humanidade. 

«Que, entre vós, tudo se faça com amor.» (1Cor 16,14)

Impressiona que Paulo – no texto grego – exorte a agir “estando no amor”, como a indicar-nos uma condição estável, uma inabitação em Deus, que é Amor.

Como poderemos, de facto, acolher-nos reciprocamente e acolher cada pessoa com esta atitude, senão a partir do reconhecimento de que nós próprios somos amados por Deus, até nas nossas fragilidades?

É com esta renovada consciência que é possível abrirmo-nos sem medo aos outros, para compreender as suas necessidades e para nos colocarmos ao seu lado, partilhando recursos materiais e espirituais.

Olhemos para o modo como Jesus atuou; é Ele o nosso modelo.

Ele foi sempre o primeiro a dar: «[…] a saúde aos doentes, o perdão aos pecadores, a vida a todos nós. Ao instinto egoísta de acumular opõe a generosidade; à concentração nas próprias necessidades, a atenção aos outros; à cultura do ter, a cultura do dar. Não interessa se podemos dar muito ou pouco. O importante é o modo como damos, quanto amor colocamos até num pequeno gesto de atenção aos outros. […] É essencial o amor, porque sabe ir ao encontro do próximo numa atitude de escuta, de serviço, de disponibilidade. Como é importante […] procurar ser o amor junto de cada um! Encontraremos o caminho direto para entrar no seu coração e elevá-lo» [C. Lubich, Palavra de Vida de outubro de 2006, em Parole di Vita, a/c Fabio Ciardi (Opere di Chiara Lubich 5) Città Nuova, Roma 2017, pp. 791-792.].

«Que, entre vós, tudo se faça com amor.» (1Cor 16,14)

Esta Palavra ensina a aproximarmo-nos dos outros com respeito, sem falsidade, com criatividade, dando espaço às suas mais belas aspirações, para que cada um dê o seu próprio contributo para o bem comum.

Ajuda-nos a valorizar cada ocasião concreta da nossa vida quotidiana: «[…] desde o trabalho em casa, nos campos ou nas oficinas, aos trâmites burocráticos, às tarefas escolares, até às responsabilidades no campo civil, político ou religioso. Tudo se pode transformar em serviço atento e gentil» [ Ibid. p. 792. ].

Poderemos imaginar um mosaico de Evangelho vivido na simplicidade.

Dois pais escreveram: «Quando uma vizinha, angustiada, nos disse que o seu filho estava na prisão, combinámos ir visitá-lo. Jejuámos no dia anterior à visita, esperando ter a graça de lhe dizer as palavras certas. Depois, pagámos a caução para que fosse libertado» [S. Pellegrini, G. Salerno e M. Caporale, Famílias em ação – Um mosaico de vida, Cidade Nova 2022, p. 71.].

Um grupo de jovens de Buea (sudoeste dos Camarões) organizou uma recolha de bens e de fundos para ajudar os refugiados internos, por causa da guerra em curso [Texto adaptado do site https://www.unitedworldproject.org/pt-br/workshop/camaroes-partilha-com-pessoas-deslocadas/.]. Visitaram um homem que perdeu um braço durante a fuga. Conviver com esta incapacidade tornou-se para ele um grande desafio, porque os seus hábitos mudaram drasticamente. «Disse-nos que a nossa visita lhe deu esperança, alegria e confiança. Sentiu o amor de Deus através de nós», contou a Regina. Acrescentou a Marita: «Depois desta experiência, estou realmente convencida que nenhuma dádiva é pequena se for feita com amor… Não é preciso mais nada: é o amor que faz mover o mundo. Experimentemo-lo!»

[1] Este mês, a Palavra de Vida que nos é proposta é a mesma que um grupo de cristãos de várias igrejas da Alemanha escolheu para viver durante todo este ano.