segunda-feira, 1 de novembro de 2021


Palavra de Vida

Novembro de 2021

Letizia Magri

Felizes os que promovem a paz, porque eles serão chamados filhos de Deus (Mt 5,9).

O evangelho de Mateus foi escrito por um cristão proveniente do ambiente judaico daquele tempo. É por isso que contém tantas expressões típicas daquela tradição cultural e religiosa.

No capítulo 5, Jesus é apresentado como o novo Moisés, que sobe ao monte para anunciar a essência da Lei de Deus: o mandamento do amor. Para dar solenidade a este ensinamento, o evangelho diz-nos que Ele se sentou, como um mestre.

Não só, Jesus é também a primeira testemunha daquilo que anuncia. Isto torna-se muito evidente quando proclama as Bem-aventuranças, o programa de toda a sua vida. Nelas é revelada a radicalidade do amor cristão, com os seus frutos de bênção e plenitude da alegria. Precisamente, bem-aventuranças. 

Felizes os que promovem a paz, porque eles serão chamados filhos de Deus (Mt 5,9).

Na Bíblia, a paz – Shalom, em hebraico – indica a condição de harmonia da pessoa consigo mesma, com Deus e com aquilo que a circunda. Ainda hoje se usa essa saudação entre as pessoas, como votos de vida plena. A paz é, acima de tudo, uma dádiva de Deus, mas depende também da nossa adesão.

Entre todas as bem-aventuranças, esta aparece como a mais ativa. Convida-nos a sair da indiferença, para nos tornarmos construtores de concórdia entre nós e à nossa volta, usando a inteligência, o coração e as mãos. Requer o nosso compromisso de cuidar dos outros, de sanar feridas e traumas pessoais e sociais provocados pelo egoísmo que divide, de promover todos os esforços nesta direção.

Como Jesus, o Filho de Deus, que cumpriu a sua missão quando deu a sua vida na cruz, para unir a Humanidade ao Pai e estabelecer a fraternidade sobre esta Terra. Por isso, todo aquele que for um construtor de paz assemelha-se a Jesus e é reconhecido, como Ele, filho de Deus.

Felizes os que promovem a paz, porque eles serão chamados filhos de Deus (Mt 5,9).

Seguindo os passos de Jesus, também nós podemos transformar cada dia numa “jornada da paz”, pondo fim às pequenas ou grandes guerras que quotidianamente se travam à nossa volta. Para realizar este sonho, é necessário construir redes de amizade e solidariedade, estender as mãos para ajudar, mas também para aceitar a ajuda dos outros.

Como contam a Denise e o Alessandro: «Quando nos conhecemos, sentíamo-nos bem na companhia um do outro. Casámo-nos e no início foi muito bom, também com o nascimento dos filhos. Com o passar do tempo, começaram os altos e baixos. Deixou de haver qualquer tipo de diálogo entre nós. Tudo se tornava motivo para uma contínua discussão. Decidimos permanecer juntos, mas caíamos sempre nos mesmos erros, no rancor e nas discussões. Um dia, um casal amigo fez-nos a proposta de participarmos num percurso de apoio a casais em dificuldade (Cf. 10 anni di “Percorsi di luce”, em https://www.focolare.org/famiglienuove). Encontrámos não só pessoas competentes e preparadas, mas uma “família de famílias”, com quem partilhámos os nossos problemas: já não estávamos sozinhos! Reacendeu-se uma luz, mas foi apenas o primeiro passo: voltando para casa, não foi fácil e ainda agora caímos algumas vezes. O que nos dá força é ajudarmo-nos um ao outro, com o compromisso de recomeçar e de permanecer em contacto com estes novos amigos, para avançarmos juntos».

Felizes os que promovem a paz, porque eles serão chamados filhos de Deus (Mt 5,9).

A paz, a paz de Jesus, como diz Chiara Lubich «exige de nós coração e olhos novos para ver todos como candidatos à fraternidade universal».

Ela acrescenta: «Podemos questionar-nos: “Também aqueles vizinhos conflituosos? Também os colegas de trabalho que criam obstáculos à minha carreira? Também os que militam noutro partido ou são adeptos de outra equipa de futebol? Também as pessoas de religião ou nacionalidade diferentes da minha?” Sim, todos são meus irmãos e minhas irmãs. A paz começa precisamente aqui, na relação que estabeleço com cada próximo. “O mal nasce no coração do homem – escrevia Igino Giordani – e, para remover o perigo da guerra, é preciso remover o espírito de agressão, de abuso e de egoísmo que originam a guerra: é preciso reconstruir uma consciência” (I. Giordani, L’inutilità della guerra, Città Nuova, Roma 20032, p. 111). O mundo muda se mudarmos nós, […] sobretudo, pondo em evidência aquilo que nos une, poderemos contribuir para a implementação de uma mentalidade de paz e trabalhar juntos para o bem da Humanidade. […] No fim, é o amor que vence, porque é mais forte que tudo o resto. Neste mês, procuremos viver assim, para sermos fermento de uma nova cultura de paz e de justiça. Veremos renascer em nós e à nossa volta uma nova Humanidade» (C. Lubich, Palavra de Vida de Janeiro de 2004, em Parole di Vita, a/c Fabio Ciardi (Opere di Chiara Lubich 5), Città Nuova, Roma 2017, pp. 709-712).


Hoje … comemoramos todos os fiéis defuntos, que "nos precederam com o sinal da fé e dormem o sono da paz" (Oração eucarística, 1). É muito importante que nós cristãos vivamos a relação com os defuntos na verdade da fé, e olhemos para a morte e para o além à luz da Revelação. Já o apóstolo Paulo, escrevendo às primeiras comunidades, exortava os fiéis a "não estar tristes como os outros que não têm esperança". Se de facto escrevia cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também Deus, através de Jesus, reunirá com ele todos os que estão mortos (1 Ts 4, 13-14). É necessário também hoje evangelizar a realidade da morte e da vida eterna, realidades particularmente sujeitas a crenças supersticiosas e a sincretismos, para que a verdade cristã não corra o risco de se misturar com mitologias de vários tipos.

…  A fé cristã é também para os homens de hoje uma esperança que transforma e ampara a sua vida (cf. ibid., 10)? E mais radicalmente:  os homens e as mulheres desta nossa época ainda desejam a vida eterna? Ou tornou-se, porventura, a existência terrena o seu único horizonte? Na realidade, como já observava Santo Agostinho, todos queremos a "vida bem-aventurada", a felicidade, queremos ser felizes. Não sabemos bem o que seja e como seja, mas sentimo-nos atraídos por ela. Esta é uma esperança universal, comum aos homens de todos os tempos e lugares. A expressão "vida eterna" pretende dar um nome a esta expectativa insuprimível:  não uma sucessão infinita, mas o imergir-se no oceano do amor infinito, no qual o tempo, o antes e o depois já não existem. Uma plenitude de vida e de alegria:  é isto que esperamos e aguardamos do nosso ser com Cristo (cf. ibid., 12).

Renovamos hoje a esperança da vida eterna fundada realmente na morte e ressurreição de Cristo. "Ressuscitei e agora estou sempre contigo", diz o Senhor, e a minha mão ampara-te. ... Onde mais ninguém te pode acompanhar e para onde nada podes levar, lá eu espero por ti para transformar para ti as trevas em luz. Mas a esperança cristã não é apenas individual, é sempre também esperança para os outros. As nossas existências estão profundamente ligadas umas às outras e o bem e o mal que cada qual pratica atinge sempre também os outros. Assim a oração de uma alma peregrina no mundo pode ajudar outra alma que se está a purificar depois da morte. Eis por que hoje a Igreja nos convida a rezar pelos nossos queridos defuntos e a visitar os seus túmulos nos cemitérios. Maria, estrela da esperança, torne mais forte e autêntica a nossa fé na vida eterna e ampare a nossa oração de sufrágio pelos irmãos defuntos.

Bento XVI, «ANGELUS», 2 de Novembro de 2008